• Av. Padres Olivetanos, 475, Vila Esperança - São Paulo/SP
  • Av. Padres Olivetanos, 475, Vila Esperança
    São Paulo/SP

O verbo é agir, e não reagir

19 de março de 2025

O verbo é agir, e não reagir

O mal comportamento é algo que assombra muitos pais. A criança que joga tudo no chão, grita, bate, morde... nossa, é muita coisa!

“Ah, aposto que esse texto aqui vai me ajudar a fazer meu filho parar com isso de uma vez por todas! Terei paz, finalmente!”. Sinto muito, colega, mas não é bem assim que a coisa funciona, vamos tentar dar um jeito nisso (talvez não da forma exata e mágica que você gostaria que fosse, mas, uma forma possível).

Primeira coisa é dar uma definição um pouco diferente de mal comportamento. Um ponto de vista novo, que talvez você não conheça ainda.

Mau comportamento é a ausência de conhecimento ou habilidade de atingir um objetivo de forma eficiente, comumente proveniente do uso do cérebro primitivo que conhece somente as limitadas opções de luta e fuga. Ou seja, por conta de um cérebro ainda em desenvolvimento, a criança toma atitudes que não são completamente adaptativas para o mundo social. E isso é esperado. Até aqui, sem novidade nenhuma.

Agora a conversa vai tomar dois rumos diferentes. Vamos pelo caminho A, primeiro.

Muitos adultos, contudo, confundem desenvolvimento infantil normal com mau comportamento. Crianças muito pequenas ainda não desenvolveram habilidades sociais, linguísticas e lógicas para conseguirem o que querem de forma mais eficiente e coerente. Portanto, ainda não conhecem conceitos formais de causa e efeito ou mesmo colocar e traduzir em palavras o que sentem, por exemplo.

Muito bem, então até aqui chegamos em um ponto comum. Muito do que a criança faz e que é considerado mal comportamento na verdade é o que ela consegue fazer naquele momento. É o que é possível pra ela. Um pouco injusto exigir dela mais do que ela consegue dar, não é mesmo? Acho que seria o equivalente a você começar a academia e o instrutor mandar você levantar 100kg na barra, ou sua empresa mandar você de surpresa para uma reunião em Sueco, sendo que você não tem a menor ideia de como essa língua funciona.

Quando uma criança de 2 anos está no parquinho e quer que todos os brinquedos sejam dela, gritando e arranhando os colegas que se aproximam, isso é um comportamento ESPERADO, uma vez que ela não sabe fazer diferente. Não adianta exigir dela que seja a pessoa mais gentil e desprendida do mundo naquele momento e naquela idade.

Isso não quer dizer que você não deva fazer nada. Ela não pode bater em ninguém. A proposta aqui é que a forma como você entende a situação mude e você possa agir com mais consciência. Para entender maneiras de manejar a criança nessas situações, você pode checar outros textos já escritos, onde eu detalho algumas técnicas que você pode aplicar e aumentar as chances de ter sucesso na empreitada que se apresenta.

Agora, a dica é outra. E até simples, mas difícil de fazer as vezes. Quando essas coisas acontecerem, você para e respira. É isso, gente. Para, inspira por alguns segundinhos, expira por mais alguns e repete pra você mesmo(a) “é o que ele(a) sabe fazer agora, meu trabalho aqui é gerenciar o possível”. Isso se chama técnica de autoinstrução e é um modelo bastante usado com paciente na Terapia Cognitivo-Comportamental, principalmente em início de tratamento. Não é nenhum mambo-jambo sem serventia. Se vocês fizerem isso com convicção, sua raiva diminui, as ideias ficam mais claras e as reações fisiológicas entram em equilíbrio de forma mais eficiente e você consegue AGIR, ao invés de REAGIR à situação. Vejo isso como um ato bastante justo com as crianças, afinal, quem nunca acabou pegando pesado com o filho em momentos como esse?

Certo, esse foi o caminho A. De forma resumida, é entender que as vezes o que chamamos de mal comportamento na verdade é o comportamento normal esperado de uma criança pequena e que é nossa responsabilidade compreender isso, gerenciar a situação de forma eficiente e não exigir dela o que ela não pode dar.

Agora, o caminho B.

Aqui a coisa fica mais complexa. Em muitos momentos a criança já tem o desenvolvimento necessário para entender que certas coisas não são certas. Ela não só tem a capacidade, como também já foi ensinada, já aconteceram outras situações parecidas e ela foi orientada, mas continua com o mal comportamento. O que fazer aqui?

Bom, tente não esquecer que algumas coisas levam tempo pra se implantar, então pode ser que ela esteja só se adaptando à uma coisa nova. Mas, se esse não for o caso, tem uma coisa que temos de nos atentar.

Podemos ver o mal comportamento como um “idioma” da criança, que está tentando nos dizer algo que ainda não sabe comunicar em português. Por trás desses atos existe uma mensagem codificada de forma diferente. Então, da mesma forma que você traduz “the book is on the table”, você pode traduzir aquela atitude em alguma outra coisa.

O que a criança está tentando comunicar quando toma tal atitude?

Em algum momento iremos trabalhar na escola um workshop bem completo e detalhado sobre mal comportamento enquanto tentativa de comunicar alguma coisa, mas acho interessante mostrar aqui um ou outro aspecto desse fenômeno.

Por vezes, uma criança que sente falta dos pais muito ocupados pode fazer coisas para chamar a atenção deles. Ela pode riscar uma parede enquanto o pai está limpando a casa ou quando a mãe está em uma reunião importante no computador. A mensagem aqui é “pai, mãe, estou com a impressão de que não sou amada o suficiente por vocês. Eu tento, tento, mas parece que nada é suficiente. Por favor, olhem pra mim”.

Não é sobre a parede. É sobre a mensagem. Se ela conseguisse falar exatamente isso para você, com essas exatas palavras, você brigaria com ela? Acredito que não. Aliás, tenho certeza de que teria muito acolhimento. Então, por que brigamos com ela quando ela diz exatamente a mesma coisa, mas em outro “idioma”?

Pra mim a maioria dos pais são amorosos e querem fazer o melhor. Por isso a disseminação de informação científica relevante sobre criação de filhos é tão importante. A única razão pela qual brigamos com nossos filhos quando eles pedem ajuda é a falta de conhecimento, informação. Mas, agora você já sabe.

Claro que cada situação é uma situação. Pode ser que essa criança só não soubesse que não poderia riscar a parede, pode ser que ela esteja só no processo de aprendizagem mesmo. Mas, pode ser exatamente aquilo que descrevi. Para cada situação, um manejo diferente. Para cada momento, um olhar adaptado.

Não é fácil ver uma parede riscada. Mas nenhuma parede vale mais que um pedido de socorro do seu filho.

Então, de novo: Qual a mensagem por trás do mal comportamento? É um pedido, um desejo de dizer algo, um experimento curioso? Cabe a nós descobrir isso no dia a dia.

Mal comportamento é uma coisa difícil de lidar as vezes, eu sei. Cansa, demanda energia e paciência. Por isso, pare, respire, pense e aja. Não reaja. Vai dar tudo certo. Você é uma boa mãe. Você é um bom pai.

Henrique Costa Barros (CRP: 06/210223)
Psicólogo Clínico e Educador Parental do Vivência e Convivência
@psi_henrique.costa